Hierarquias e outras chatices

Reconheci para mim própria (assumi!), há cerca de uma semana, que tenho imensa dificuldade em lidar com hierarquias.

E analisando o meu percurso até hoje, esta conclusão em nada surpreende.
Desde cedo (demasiado cedo?) fiz frente aos meus pais. Nunca aceitei uma decisão fundamentada no "porque nós somos teus pais". Tudo tinha de ser devidamente ponderado e a minha opinião tinha de ser levada em conta em pé de igualdade com a deles. Desde muito cedo discordamos no meu modo de vida o que levou a variadíssimas discussões que terminavam, frequentemente (e este seria apenas o modo mais calmo de terminar as discussões), comigo a responder "pronto, tu achas que é assim mas eu não acho!".

Já na faculdade, a praxe metia-me nojo. Lembro-me perfeitamente do primeiro dia em que vi aquela palermice. Seríamos à volta de 100 alunos na fila para a cantina, à hora do almoço. O que seria lógico? Estarmos todos a conversar e a conhecer-nos, certo? Não. Para aquela cambada de atrasados mentais, o lógico era estarem todos de olhos postos no chão, em silêncio. Como eu considerava essa postura sinónimo de subserviência, recusei-me a olhar para o chão e lá continuei na fila à espera para comer. Olhava aquela cambada... Tratavam-se por "doutores". Mas o que eram eles? Estudantes universitários como eu! Só que eu ainda não tinha chumbado a nada e eles provavelmente já. Surgiu uma veterana. Pensei eu "se já és veterana, já tinhas idade para ter juízo e não andar nesta palhaçada...".

- Caloira, olhos no chão!
- Hã?
- Olhos no chão, caloira.
- Não vou olhar para o chão.
- Caloira, olhos no chão.
- Já disse que não.

A gaja ficou uma fera...

- Caloira, tira todas essas pulseiras e colares.
- Não tiro.
- Caloira, pulseiras e colares fora, já!
- Não!

E assim foi que me declarei anti-praxe. Depois lá veio outra veterana, que me tinha ajudado no primeiro dia e me reconheceu, convencer-me a pelo menos experimentar a praxe. Foi a maior burrice que fiz na minha vida: dar-lhe ouvidos.
Bem, mas a ideia era falar de hierarquias.
Pois... aquela comigo também não funcionou.

Também as hierarquias na família alargada me fazem alguma comichão.
Acho a coisa mais idiota alguns dos meus tios e primos afastados, que estão muito menos habilitados a discursar sobre certos assuntos do que eu, acharem que as suas opiniões ou bitaites são mais válidos apenas porque são mais velhos.
E enerva-me profundamente a mania que têm de pôr os meus primos mais novos a comer em mesas separadas. Não cabem todos na mesa principal, apertem-se! Acaso os mais novos são menos que os outros? Porque não ficam outros em mesas separadas? Presume-se logo à partida que, se alguém tem de ficar de lado, que sejam os mais novos? Que raio de mentalidade é esta?

Não quero com isto dizer que não trato as pessoas com as devidas vénias. Claro que o faço. Mas por razões de respeito e reconhecimento que eu estabeleço para mim própria e não por hierarquias externamente impostas.

Ultimamente tenho pensado muito neste meu "problema" pois estou cada vez mais consciente que a nível laboral poderei vir a ser integrada numa hierarquia.
E, se assim for, será que me vou controlar?

4 sobreviveram ao "lápis azul":

Anônimo disse...

claro que não!!...(olha o monstrinho dentro do teu peito).


montaatuaempresa.com

Timona disse...

Eheh, adorei :)
Concordo plenamente, especialmente na parte da burrice que fiz ao tentar "apesar de tudo" participar minimamente nas praxes... blharg
Quanto ao "porque nós somos teus pais" nem comento.. :P

nada desta vida disse...

curioso hoje escreveres sobre isso. ontem falei com uma amiga acerca da minha experiência com a praxe. estava num anfiteatro à espera de receber as boasvindas quando entra um bando de trajados a dizer que os caloiros eram cães e que deviam estar de 4. em quase 500 alunos todos, menos eu, ficaram de 4. recusei e quando um trajado vem ter comigo e me diz: caloira de 4! eu disse: de 4 só me põe quem eu quero, quando eu quero e tu, nem hoje, nem nunca, me terás de 4.
depois ele disse-me se sabia que ao recusar a praxe estava a recusar fazer parte da cena académica, q n podia usar traje, enfim...eu disse q n sabia, mas ficava a saber e que nunca na vida iria usar algo tão feio cmo um traje académico.

a mim o que me perturba grandemente nem é a praxe, é a ansiedade com que a maioria aguarda a praxe, e a facilidade com que aceitam fazer coisas medonhas. isso ainda me mete mais confusão. nós éramos 500, eles eram meia dúzia. como é possivel tanta estupidez junta?!?!

praxe e tourada é a mesma merda. os pressupostos são os mesmos.

Gayja disse...

Timona, felizmente foi sol de pouca dura (não foi preciso chegar sequer a meio do primeiro semestre para retornar à minha primeira decisão). ;)

cara subtil, eu também nunca comprei traje. Acho o traje, principalmente o feminino, feio, parolo, nada prático e com um simbolismo absolutamente estúpido (orgulho em ser estudante? mas acaso ter o nosso nome escrito numa universidade faz de nós alguma coisa de especial?! enfim....)! Além disso, habituei-me desde pequena a ouvir ao meu lado um "fascistas!" sempre que passávamos por estudantes trajados. A mim, o que mais perturba na praxe é... tudo. (um dia ainda hei-de fazer um post sobre isso)